Os Escravos na Roma Antiga – Trecho de “As Saturnálias”

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Neste trecho, os diferentes convidados presentes à Saturnália, ouvem como Pretextato – o anfitrião – justifica a importância da escravidão e dos escravos para a vida cotidiana. É interessante notar o idealismo da escravidão presente no texto.


Que não devemos desprezar a condição dos escravos, e por que os deuses cuidam deles, e por que é certo que muitos deles eram fiéis, clarividentes, corajosos e até filósofos; a origem das Sigilárias

“Eu não consigo suportar”, disse Evângelo, “que nosso amigo Pretextato, para fazer brilhar e mostrar sua inteligência, tenha fingido há pouco honrar algum deus fazendo os escravos comerem com os senhores; como se os deuses se importassem com os escravos, ou como se qualquer pessoa de bom senso sofresse em sua própria casa a desgraça de um grupo tão ignóbil. Ele também afirma incluir entre as práticas religiosas as Sigilárias, aquelas pequenas figuras de barro com as quais as crianças mais novas se divertem. Não seria admissível duvidar das superstições que ele mistura com a religião, por que tem fama de ser o príncipe dos conhecimentos religiosos?”

A estas palavras, todos foram tomados de indignação. Mas Pretextato respondeu com sorrisos: “Não me importo que você, Evângelo, me tome por um homem supersticioso e indigno de toda confiança, se razões sólidas não lhe mostrarem a certeza das minhas duas afirmações. E, falando de escravos, em primeiro lugar: isto é uma piada, ou você pensa seriamente que existe uma espécie de homens que os deuses imortais não considerem dignos de sua providência e cuidado… ou você, por acaso, não sofreria caso os escravos não estivessem entre os homens?

Aprenda, então, com que indignação o tormento de um escravo penetrou no céu.

No ano duzentos e sessenta e quatro da fundação de Roma, certo Autrônio Máximo, depois de ter tido seu escravo espancado com varas, o fez andar no circo, antes da abertura dos jogos públicos , amarrado a uma forca. Júpiter, indignado com esta conduta, ordenou em sonhos a um homem chamado Ânio que anunciasse ao Senado que esta cruel ação o havia desagradado. Ânio, descumprindo a ordem, teve seu filho tomado por uma morte súbita; e, após uma segunda advertência, foi punido por sua reiterada negligência por uma atonia corporal, da qual foi subitamente afligido. Por fim, por conselho de seus amigos, ele mesmo foi carregado em uma liteira neste estado, e narrou seu sonho ao Senado. Assim que terminou de falar, recuperou imediatamente sua saúde e saiu do local da assembleia. Portanto, e para apaziguar Júpiter, um decreto do Senato decreteu a lei Mévia aos dias das festas do circo: o dia chamado instauratius, assim chamado, não como alguns pensam, pelo nome grego do instrumento de castigo σταυρός; mas pela recuperação de Ânio, de acordo com a opinião de Varrão, que afirma que instaurare é formado a partir do instar nouare.

Perceba então que o maior dos deuses tinha o apreço por um escravo. O que inspirou em você um desprezo tão profundo e estranho pelos escravos? Como se eles não fossem formados e alimentados pelos mesmos elementos que você, como se não fossem animados pelo mesmo alento, derivando do mesmo princípio! Considere que aqueles a quem você chama de seus bens nascem dos mesmos princípios que você, desfrutam do mesmo céu, vivem e morrem como você. Eles são escravos, mas são homens. Eles são escravos, mas nós também não somos escravos? Se você considerar que a fortuna tem tanto poder sobre nós quanto sobre eles, pode acontecer que você os veja como livres, e eles, por sua vez, o vejam como um escravo. Você não sabe com que idade Hécuba, Creso, a mãe de Dário, Diógenes e o próprio Platão se tornaram escravos? E por que devemos ficar tão horrorizados com a palavra escravidão? Alguém só é escravo por necessidade; mas um escravo pode ter uma alma livre. Você terá menosprezado o escravo se puder me mostrar quem não o é. Um é escravo do deboche, um da ganância, outro da ambição; todos são escravos da esperança e do medo.

Certamente, nenhuma servidão é mais vergonhosa do que aquela que é voluntária; e ainda assim pisamos, como um ser desprezível, o infeliz que a sorte colocou sob o jugo; e não queremos retificar nossos preconceitos a esse respeito. Você encontrará entre os escravos alguns que são incorruptíveis, enquanto você encontrará um mestre cuja esperança de ganho o faz cobrir com beijos as mãos dos escravos de outras pessoas. Não é, portanto, de acordo com sua condição que julgarei os homens, mas de acordo com seu caráter. Cada um faz seu próprio caráter; é o acaso que estabelece as condições. Assim como aquele que compraria um cavalo e consideraria apenas sua sela e arreios, também o mais tolo de todos os homens é aquele que pensa que deveria julgar seu semelhante por suas roupas ou por sua condição, ou por qual peça de vestuário o envolve.

Não é apenas no Senado ou no fórum, meu caro Evângelo, que você deve procurar por amigos. Se for cuidadoso, você os encontrará em sua própria casa. Trate seu escravo, portanto, com gentileza; admita-o graciosamente em suas conversas e, às vezes, aceite dele um conselho necessário. Observe nossos ancestrais que, para salvar os senhores da odiosidade da dominação e os escravos da humilhação da servidão, consideravam os escravos como parte da família de um paterfamilias. Então, acredite em mim, faça-se agradecido em vez de temido por seus escravos.

Alguém pode me acusar de rebaixar os senhores de sua posição, e de chamar os escravos à liberdade, porque eu disse que deveriam antes reverenciar seus senhores do que temê-los. Aquele que pensa assim esqueceria que basta aos mestres conceder-lhes o que é suficiente para os deuses. Além disso, nós amamos aquele que respeitamos; mas o amor não pode ser unido ao medo. De onde você acha que vem o insolente provérbio: ‘Tantos escravos quanto inimigos’? Não, eles não são nossos inimigos, mas nós os fazemos assim quando somos arrogantes, insolentes e cruéis para com eles. O hábito de uma vida de deleite nos leva a um excesso de extravagância tal que tudo que não responde imediatamente à nossa vontade desperta em nós raiva e fúria. Tornamo-nos verdadeiros tiranos em nossas casas, e queremos exercer toda a extensão de nossa autoridade sobre os escravos, sem qualquer consideração pela justiça.

De fato, além de vários outros tipos de crueldade, há mestres que, enquanto se enchem avidamente da abundância de suas mesas, não permitem que seus escravos, que estão de pé, movam seus lábios para dizer uma única palavra. O mais leve murmúrio é suprimido pela vara: mesmo casos acidentais não escapam à punição. Tosse, espirros, soluços, são severamente punidos. Assim, acontece que aqueles que não estão autorizados a falar diante de seu mestre falam muito dele; enquanto aqueles que não só mantêm a boca fechada diante de seu mestre, mas mesmo que foram capazes de falar com ele, estão prontos a perecer com ele, e a trazer sobre suas próprias cabeças os perigos que o ameaçavam. Estes escravos falavam às refeições, mas se calavam nas torturas.

Você gostaria que passássemos pelos casos generosos devidos aos escravos? O primeiro é sobre Urbino. Condenado à morte, ele estava escondido em Reate. Quando seu esconderijo foi descoberto, um de seus escravos, usando seu anel e suas roupas, deitou-se em seu lugar na cama para a qual aqueles que o perseguiam se dirigiam, apresentou sua cabeça aos soldados, e recebeu o golpe fatal como se fosse Urbino. Posteriormente, Urbino, tendo sido reabilitado, ergueu um monumento a este escravo, com uma inscrição atestando tão grande devoção. Esopo, um liberto de Demóstenes, que foi informado do adultério que seu mestre havia cometido com Júlia, foi torturado por muito tempo, mas perseverou em não trair seu mestre, até que o próprio Demóstenes, pressionado por outras testemunhas, confessou o crime. Se você acha que é sempre fácil esconder o segredo de um único indivíduo, você deve saber que os libertos de Labieno, que o haviam escondido, não puderam ser forçados a delatá-lo por qualquer tipo de tormento. E para que ninguém diga que esta fidelidade dos libertos se devia mais ao reconhecimento do benefício da liberdade do que à sua boa natureza, ouça um aspecto da benevolência por parte de um escravo para com seu senhor, mesmo enquanto ele o castigava. Ântio Restião, proscrito, fugiu sozinho à noite. Enquanto seus escravos saqueavam sua propriedade, um deles, que havia sido colocado em ferros e marcado na testa, encontrando-se, após a condenação de seu mestre, entregue pela compaixão de outro, foi em busca do fugitivo, exortando-o a não temê-lo, dizendo que sabia que era à sorte e não ao seu mestre que deveria imputar sua afronta. Este escravo veio para levar alimentos para Restião todo o tempo em que este permaneceu escondido. Quando depois sentiu que aqueles que o perseguiam estavam se aproximando, cortou a garganta de um velho que o acaso lhe ofereceu, construiu uma pira sobre a qual jogou o cadáver; e tendo ateado fogo a ela, veio ao encontro daqueles que procuravam a Restião, dizendo-lhes que tinha feito justiça ao fora-da-lei, e que o havia castigado mais cruelmente do que ele mesmo havia sido castigado. Os perseguidores acreditaram nele, e Restião foi salvo.

Cepião, que havia conspirado contra Augusto, tendo sido descoberto e condenado, foi carregado por um escravo em uma cesta até o Tibre: tendo descido a Óstia, foi conduzido de noite à casa de campo de seu pai, no território de Laurente. Afastado de Cumas por um naufrágio, escondeu-se com seu mestre em Nápoles. Ali, tendo sido capturado por um centurião, nem dinheiro nem ameaças o fizeram trair seu mestre.

Asínio Polião quis forçar implacavelmente os habitantes de Pádua a entregarem suas armas e dinheiro e, por isso, se esconderam. Depois prometeu liberdade e recompensa aos escravos que denunciassem seus senhores. Mas é sabido que nenhum deles, seduzidos pela recompensa, quis trair seu mestre.

Permita-me narrar a você uma característica que é, da parte dos escravos, não apenas um ato de fidelidade, mas mesmo uma invenção engenhosa voltada ao bem. Durante o cerco de Grumento, alguns escravos, tendo deixado sua senhora, dirigiram-se ao inimigo. Quando a cidade foi tomada, eles concordaram entre si, e correram para a casa de sua senhora, e a arrastaram com um ar ameaçador, dizendo àqueles que encontravam que tinham finalmente o poder de punir sua cruel senhora. Tendo-a levado assim, como se a levassem à tortura, colocaram-na em segurança com respeitosa piedade.

Veja este outro caso: um escravo que tem a magnanimidade de preferir à morte em detrimento da ignomínia. O escravo de C. Vécio, do país dos Pelignes, na Itália, vendo-o preso por suas próprias coortes, matou-o para que não fosse entregue a Pompeu, e depois se matou para que não sobrevivesse a seu senhor. Euporo ou, segundo contam outros, Filócrates, escravo de C. Graco, seguiu-o de forma incansável, fugindo do Monte Aventino, enquanto havia esperança de salvá-lo, e o defendeu o máximo que pôde; quando Graco foi morto, o escravo se matou sobre o cadáver de seu senhor. O escravo de Publ. Cipião, o pai do Africano, colocou seu mestre, que acabara de ser ferido numa luta com Aníbal, sobre um cavalo e, enquanto todos o abandonavam, o trouxe sozinho para o acampamento.

Mas é uma coisa pequena ter servido seus senhores vivos; os escravos farão mais: eles estarão sempre ansiosos para vingá-los. Um escravo do rei Seleuco, que havia se tornado escravo de um dos amigos do rei, e que havia sido seu assassino, vingou a morte de seu primeiro amo, matando o segundo enquanto jantava.

O que mais queremos? Queremos ver as duas virtudes mais nobres unidas em um escravo, a capacidade de governar e a magnanimidade de desprezar o trono? Messênio Anaxilau, que fundou Messina na Sicília, e foi tirano dos Regianos, tendo deixado crianças, contentou-se em recomendá-las aos cuidados de seu escravo Micito, que administrava religiosamente esta tutela, e governava com tanta moderação, que os Regianos não se ressentiram de serem governados por um escravo. Posteriormente, Micito entregou as crianças já crescidas junto ao governo, bem como seus bens, e se aposentou com uma pequena soma de dinheiro – tudo em Olímpia, onde chegou à velhice em profunda tranquilidade.

Vários exemplos também nos ensinam quão úteis os escravos têm sido para o interesse público. Durante a Guerra Púnica, como havia escassez de cidadãos para alistamento, os escravos, tendo-se oferecido para lutar por seus senhores, foram admitidos na categoria de cidadãos; e, por terem se oferecido voluntariamente, foram chamados de uolones (voluntários). Após a batalha de Canas, os romanos derrotados compraram oito mil escravos e os levaram como soldados; e embora tivesse custado menos resgatar os prisioneiros, a República, naquela violenta crise, preferiu confiar nos escravos. Após a famosa derrota de Trasimeno, os libertos também foram chamados para o juramento militar. Durante a Guerra Social, doze coortes, criadas entre os libertos, realizaram ações de memorável valor. Sabe-se que César, a fim de substituir os soldados que havia perdido, aceitou escravos de seus amigos, e deles obteve um serviço muito bom. César Augusto formou, na Germânia e Ilíria, várias coortes de libertos, chamadas de voluntários.

Não pense que tais coisas aconteceram somente em nossa República. Os boristenianos, atacados por Zopirião, libertaram os escravos, deram aos estrangeiros o direito de cidadania, aboliram os títulos de dívidas; e foram assim capazes de resistir ao inimigo. Em Esparta, restavam apenas quinhentos lacedemonianos em condições de portar armas; foi quando Cleomenes, com escravos libertos, recrutou nove mil combatentes. Os atenienses também, tendo esgotado os recursos públicos, deram liberdade aos escravos.

Para que você não pense que não havia virtude apenas entre os escravos homens, escute uma ação de mulheres escravas, não menos memorável que as anteriores, e mais útil à República do que qualquer outra que você possa encontrar entre as classes nobres: o Festival Das Serviçais, que é celebrada nas Nonas de Julho, é tão bem conhecido que ninguém ignora sua origem ou as razões de sua fama. Neste dia, as mulheres livres e os escravos oferecem sacrifícios a Juno Caprotina sob uma figueira selvagem, em memória da preciosa devoção que as mulheres escravas demonstraram para a preservação da honra nacional. Após uma insurreição dos gauleses, quando Roma foi tomada por eles, a República estava extremamente enfraquecida. Os povos vizinhos, desejando aproveitar a oportunidade de destruir o nome romano, nomearam Lívio Postúmio, de Fidenes, como ditador, que informou ao Senado que, caso desejassem preservar os restos da cidade, deveriam entregar as mães de família junto com suas filhas. Enquanto os pais recrutas deliberavam, incertos quanto ao curso a seguir, uma criada chamada Tutela ou Filotia se ofereceu para ir ao inimigo com outras criadas, como se fossem suas senhoras. Tendo se passado por mães e filhas, as servas foram levadas aos inimigos, seguidas por carpideiras que simulavam o luto. Lívio, tendo-as distribuído no acampamento, provocou os homens a beber, fingindo que era um dia de festa para eles. Quando os homens estavam dormindo, do alto de uma figueira selvagem perto do acampamento, elas deram um sinal para os romanos, que saíram vitoriosos ao ataque sem aviso prévio. O Senado agradecido concedeu liberdade a todas as escravas, dotou-as às custas do Estado, permitiu que usassem o traje que haviam usado na ocasião e deu o nome de Nonas Caprotinas àquele dia, por causa da figueira selvagem (caprificus) da qual os romanos receberam o sinal da vitória. O Senado também ordenou que, em sua memória, este dia fosse solenizado anualmente por um sacrifício no qual o suco da figueira selvagem deveria ser utilizado.

Também foram encontradas entre os escravos mentes altas o suficiente para alcançar a ciência filosófica. Fedo, da escola de Sócrates e seu amigo, bem como amigo de Platão a tal ponto que este último dedicou a seu nome aquele tratado divino sobre a Imortalidade da Alma, era um escravo que tinha o exterior e a alma de um homem livre. Diz-se que Cebes, um discípulo de Sócrates, foi comprado por conselho de seu mestre, e treinado por ele nos exercícios de filosofia. Fedo tornou-se depois um filósofo ilustre, e escreveu discussões de bom gosto sobre Sócrates.

Desde de Cebes, há um grande número de escravos que foram filósofos ilustres. Entre eles estava Menipo, cujas obras Varrão queria imitar em suas sátiras, que outros chamam de cínicas, e que ele mesmo chama de Menipeanas. Ao mesmo tempo viveu Pômpolo, escravo do peripatético Filostrato; Perseu, escravo do estoico Zeno; e Mis, escravo de Epicuro, cada um deles famosos filósofos. Entre eles podemos incluir também Diógenes, o Cínico, embora nascido livre, tornou-se escravo porque foi vendido para a escravidão. Xeníades o Coríntio, desejando comprá-lo, perguntou-lhe que arte ele conhecia: ‘eu sei’, respondeu Diógenes, ‘como governar homens livres’. Xeníades, admirado pela resposta, o comprou, o libertou e o confiou a seus filhos, e disse: ‘Estes são meus filhos (liberos), a quem você governará’. A memória do ilustre filósofo Epiteto é bastante recente na memória para esquecer que ele era um escravo. Dois versos dele são citados sobre si mesmo, cujo significado íntimo é: que aqueles que lutam contra a variedade dos males desta vida não são de forma alguma odiados pelos deuses; mas que a razão dos males deve ser procurada em causas secretas, que a sagacidade de poucos homens é capaz de penetrar.

Δοῦλος Ἐπίκτητος γενόμην, καὶ σῶμ᾽ ἀνάπηρος,
Καὶ πενίην Ἶρος, καὶ φίλος ἀθανάτοις.

Epiteto nasceu escravo, seu corpo está mutilado; ele é pobre como Irus; e ainda assim é querido pelos imortais.

Agora você deve estar convencido, penso eu, por que os escravos não devem ser desprezados por sua condição, já que foram objeto da solicitude de Júpiter, e é certo que muitos foram fiéis, prudentes, corajosos e até filosóficos.

Agora tenho algo mais a dizer sobre a Sigilária, para que você possa estar convencido de que falei de objetos sagrados, e não de coisas pueris. Epicado relata que Hércules, depois de matar Gerião, trazendo de volta em vitória, através da Itália, as manadas de bois que havia roubado dele, lançou no Tibre, na ponte agora chamada Sublício, construída naquela época, um número de imagens de homens igual ao número de companheiros seus que havia perdido durante sua viagem; que estas imagens, levadas para o mar pelo curso das águas, pudessem ser devolvidas à pátria dos falecidos, no lugar de seus corpos. É daí que o costume de fazer tais imagens teria se tornado uma prática religiosa. Quanto a mim, a origem deste costume me parece mais provável aquela que acabei de mencionar. Ou seja, Pelasges, instruídos por uma interpretação favorável que a palavra ‘cabeça’ poderia ser entendida como significando não cabeças humanas, mas de barro, e que a palavra φωτός significava não apenas um homem, mas também uma tocha, começou a acender tochas de cera em honra a Saturno, e figuras consagradas, ao invés de suas próprias cabeças, no altar de Saturno, contíguas à capela de Dis. Daí surgiu o costume de enviarem-se tochas de cera durante a Saturnália, e de fazer e vender figuras esculpidas de barro, oferecidas como sacrifício expiatório, para si e para sua família, em memória de Dis. Tendo o comércio destes objetos sido estabelecido durante a Saturnália, a venda continuou por sete dias, que são dias de descanso, embora nem todos sejam comemorados; mas apenas os do meio da Saturnália, ou seja, no décimo terceiro dia antes das Calendas, como já comentamos. Isso é confirmado pelo testemunho daqueles que trataram mais plenamente da divisão do ano, dos meses e dos dias, e da organização adotada por César”.


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