Charles Seignobos, o atual

A Escola Metódica francesa é a Geni da historiografia. Se você quer tomar um modelo de “como não se deve fazer história”, é muito comum apelar-se aos modelos da Escola Metódica.

Mas há metódicos e metódicos. O pior deles é aquele que se fixou nos currículos escolares e nos livros didáticos: o da história linear, essencialmente política, voltada a estudar os “grandes homens”. E é horripilante o quando esse modelo histórico custa a abandonar o dia-a-dia das escolas.

E é baseado nessa concepções que muitos historiadores gostam de chutar o clássico “Introdução aos estudos históricos” de Charles Langlois e Charles Seignobos. Chutam a obra sem lê-la. “É metódica”, pensam. “Então deve ser linear, rasteira, previsível”. Na verdade, tomam o livro apenas a partir da crítica que os historiadores de Annales faziam a ela.

Muitas delas profundamente indevidas.

O livro é escrito por Langlois e por Seignobos. Langlois é fraquinho: ele é o mais furioso dos dois, acredita que todos devem trabalhar como escravos aos historiadores, e está sempre, nos capítulos em que escreveu., reclamando de alguma coisa. Langlois tinha uma clara percepção de que era muito mais profundo e relevante do que realmente era.

Seignobos é mais calmo, ponderado, articulado. Os capítulos que escreveu são interessantes, estimulantes, e profundos. É óbvio que tem os seus problemas (a história linear, de causalidade simples, está lá). Mas, no geral, irá se surpreender todo interessado em história que quiser uma discussão absolutamente atual sobre o conhecimento histórico.

Por exemplo:

  • O papel da linguagem nos estudos históricos:

Mesmo os fatos mais comuns da vida humana, como condições sociais, ações, motivos, sentimentos, só podem ser expressos por termos vagos (rei, guerreiro, lutar, eleger). No caso de fenômenos mais complexos, a linguagem é tão indefinida que não há acordo nem mesmo quanto aos elementos essenciais dos fenômenos. O que devemos entender por uma tribo, um exército, uma indústria, um mercado, uma revolução?

  • Crítico da ideia de progresso:

De semelhante concepção otimista de uma direção racional do mundo parte a teoria do progresso contínuo e necessário de a humanidade. Embora adotada pelos positivistas, não é mais que uma hipótese metafísica. Em sentido vulgar, o “progresso” não é senão uma expressão subjetiva que designa as mudanças que se operam no sentido de nossas preferências.

  • Crítico à suposta coerência individual (algo bastante popular nos dias de hoje:

O estudo de personagens imaginários (dramáticos ou novelescos) nos habituou a procurar uma razoável relação entre os diferentes sentimentos e atos de um indivíduo: na literatura, um personagem atua conforme à lógica. Não devemos transpor ao estudo dos indivíduos de carne e osso semelhante pretensão de coerência.

  • As diferentes temporalidades históricas

Os períodos delimitados a partir de acontecimentos pontuais têm duração desigual. Essa assimetria não deve ser motivo de preocupação; um período não deve ser uma divisão temporal constante, mas o tempo transcorrido em uma fase concreta da evolução. A evolução não é um movimento regular; compreende largas séries de anos durante os quais não se produz alteração notável, depois dos quais sobrevêm épocas de rápida transformação. Esta diferença sugeriu ao Saint Simon a distinção entre períodos orgânicos (de mudança lenta) e críticos (de mudança acelerada).

“Introdução aos estudos históricos” é um livro muito rico. Uma pena que tenha sido deixado de lado como curiosidade. Conselhos, advertência, experiências que Langlois e, especialmente, Seignobos já apresentavam em sua obra, estão tendo de ser “redescobertos” na atualidade.

Um livro que foi deixado de lado por simples preconceito.

 

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